sábado, 10 de agosto de 2013

No divã

- Boa tarde
- Boa tarde..
- Me diga porque você não quer ir trabalhar?
- Eu quero, eu só estou de licença por conta das tonturas, por isso me encaminharam para cá, acham que deve ter um fundo emocional qualquer...
- E o que você acha?
- Eu?
- Você tem problemas em dizer o que acha?
- Não, é quase uma habilidade natural... Eu acho que pode ser válido, porque não né...
- Porque não o que?
- O quê?
- Você disse porque não...
- Ah é jeito de dizer...
- Você sempre diz as coisas sem pensar muito?
- Ah... não sei...acho que sim...
- POrque você sempre fala acho?
- A senhora que começou com esse lance de acho, eu só estou acompanhando...
- Doce ou salgado?
- Agora?
- Do que você gosta mais?
- Doce... nossa, uma piscininha de brigadeiro agora ia ser divino...
- Hummm, qual sua relação com o brigadeiro?
- Ah acho que boa, eu gosto dele, ele deve gostar de mim..
- Como você enxerga isso?
- Isso o quê?
- Essa relação?
- Minha e do brigadeiro? Harmoniosa, só tensa quando ele queima na panela... aonde a senhora quer chegar? Tá me parecendo sem sentido...
- Tudo pra você é sem sentido?
- Não, só essa conversa, minha relação com o brigadeiro, e a minha família, outras relações não?
- Você está fugindo da sua relação com você mesma mocinha?
- Eu? Não, eu só quero compreender o raciocínio...
- Compreender o quê?
- Eu sei lá, não é a senhora que vai me levar a isso, a compreender sei lá o quê?
- Você acha que eu sou sua tábua de salvação?
- Não, eu só estou inclusive cumprindo o encaminhamento que me deram, eu nem sei o que eu to fazendo aqui uai...
- Então você se acha normal?
- Em relação a que? Se for nessa conversa acho que eu sou a melhorzinha né...
- Voltemos ao brigadeiro...
- Ai Jesus, mas o que tem a porra do brigadeiro?
- Ficou nervosa? O termo brigadeiro lembra você de algo?
- Nâo, não fiquei, mas francamente o que tem o brigadeiro?
- A senhorita já se envolveu com militares?
- Quê??
- Talvez uma outra patente, um major...
- Olha o único Major que eu conheço é a rua Major Matheus minha senhora...
- Hummm, fale-me mais sobre isso...
- Sobre isso o quê?????
- Esse Major...
- É uma rua minha senhora, uma ruaaaaaaaaaaaa.....
- Gosta de andar nas ruas?
- Não, eu gosto mesmo é de andar em disco voador... aliás o meu está estacionado ali e eu preciso acertar o zona azul, passar bem...
- Ok, nos vemos na próxima consulta, e nada de brigadeiro até lá....
- Meu pai do céu....

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

No labirinto da emoção

Náuseas...
Vertigens...
Fala amortecida...
Desequilibrio...

Assim estava eu em um esforço avassalador para caminhar em linha reta, sem tombar para a esquerda ou direita, achei normal, afinal era um domingo depois daquele sábado, aquele sábado como antigamente, amigos, pessoas, cervejas, samba e rock´n roll.

Ressaca, quem diria...o grande aviso dos tempos de que você, colega, envelheceu! Certo, a sua cabeça ainda acredita que você tenha uns 19 anos de idade, mas o fígado meu bem, ele nunca te engana, ele mostra que você não é mais aquele dos tempos de faculdade e de festinhas animadas no por do sol da praia.

Mas como assim isso permaneceu em plena segunda feira as sete da manhã? Pois é, embriagada no trabalho fui questionada pelos meus pares se estava tudo bem, se com toda a desilusão da vida eu tinha de fato me entregue ao álcool, enfim... Mas não, eu estava ótima, sóbria, mas o meu corpo não... parecia um joão bobo animador de festinha infantil em Pirituba.

Levemente perturbada resolvi, cambaleante, levar o meu corpo ao posto de saúde para ver se de fato os meus poucos neurônios corriam o risco de terem sido mortos em uma dessas festinhas quaisquer... Depois de testes ridículos, o diagnóstico: Labirintite. Crise aguda, Passou um grande estresse nesses últimos meses? Rinite alérgica? Zumbido no ouvido? Batata.... labirinto inflamado... quem diria....

De molho, reflito ou tento, porque afinal parece que eu estou no filme Matrix e seus movimentos em câmera lenta, então é isso que o estresse é capaz de fazer? Agora entendo quando os românticos diziam que se morria de amor, quer estresse maior que amar?

domingo, 28 de julho de 2013

Chico eternamente

Bom, se você é um habitué deste espaço sabe que aqui existe um muso...
Sim, todo escritor, ou pessoa que como eu tenta escrever, que se preze tem um muso inspirador... ou musa no caso dos rapazes... Eu não poderia ficar fora dessa e vira e mexe uso esse espaço para falar e colocar belas canções do muso mor de todos os tempos: Chico Buarque.

Virou lugar comum gostar de Chico, mas o meu caso é de nascença mesmo... desde pequena meus passos são embalados por alguma canção do referido hombre. Desde então de tempos em tempos uma música fica mais no ar, a do momento é Futuros Amantes, linda, linda, linda....

O que eu gosto dessa música é o ar nostálgico dela, sim eu sou terrivelmente nostálgica, ela fala de saudade, de algo que sempre fica no ar por mais surreal ou inexplicável que seja. Gosto da melodia, do fato dela falar que nenhum amor é perdido, apenas fica por aí esperando que alguém o receba, nem que tenha que ficar milênios e milênios no ar...

Mas gosto mais ainda de como ela começa: "Não se afobe não, que nada é pra já...", para um ansioso como eu teria que ser um mantra escrito no espelho do banheiro, pra todo dia dar de cara com isso, que é o óbvio né... Mas na canção soa leve, soa calmo, aí sim mais audível aos meus ouvidos ansiosos de futuros, saudosos do passado mas que tem prestado muita atenção no que de fato importa: o presente.


quarta-feira, 24 de julho de 2013

Apenas uma carta

"Não mexe comigo
que eu não ando só.."
(Carta de amor  - Maria Bethânia, 2012)

Era alvo certeiro, andava nas matas sempre alerta, vigia de si mesma, vigia da noite... Os olhos do outro buscavam sua pele, seus cabelos, seus medos... fugia, fingia fraqueza e pedia socorro ao velho que passava e lhe estendia a mão calejada em forma de folha. Pelas mãos foi levada ao alto, alto de torre, alto de morro, alto deserto....

Entre mil grãos de areia recordava o caminho de casa, o caminho da alma e num oásis de verde miragem avistou seu coração, devolvido pelos outros que o tomaram a força. O coloca no peito, ele ainda cabe, ainda vale? Ja não avista o velho de mão folhosa e nem tampouco o deserto, está de volta a rotina de gesso e cimento, de argila e tintas, de tecidos e brocados, feijão e empanados, desperta do sonho. No centro de sua vida retoma suas cores, retoma o papel colorido que está sobre a mesa, ainda receosa dos olhares daqueles que dela tudo queriam escreve uma carta sem endereço, mas de bom apreço e destino certo, com o coração no peito está amparada novamente:

"Não mexe comigo, que eu não ando só,
 Eu tenho Zumbi, Besouro o chefe dos tupis,
Sou tupinambá, tenho os erês, caboclo boiadeiro,
Mãos de cura, morubichabas, cocares, arco-íris,
Zarabatanas, curare, flechas e altares.
À velocidade da luz, no escuro da mata escura, o breu o silêncio a espera.
Eu tenho Jesus, Maria e José, todos os pajés em minha companhia,
O Menino Deus brinca e dorme nos meus sonhos, o poeta me contou.
Não mexe comigo, que eu não ando só,
Não misturo, não me dobro.
A rainha do mar anda de mãos dadas comigo,
 Me ensina o baile das ondas e canta, canta, canta pra mim.
É do ouro de Oxum que é feita a armadura que guarda meu corpo,
Garante meu sangue, minha garganta.
O veneno do mal não acha passagem
E em meu coração Maria acende sua luz e me aponta o Caminho.
Me sumo no vento, cavalgo no raio de Iansã, giro o mundo, viro, reviro.
Tô no recôncavo, tô em Fez.
Voo entre as estrelas, brinco de ser uma,
traço o cruzeiro do sul com a tocha da fogueira de João menino,
rezo com as três Marias, vou além, me recolho no esplendor das nebulosas,
descanso nos vales, montanhas, durmo na forja de Ogum,
mergulho no calor da lava dos vulcões, corpo vivo de Xangô.
Não ando no breu, nem ando na treva
É por onde eu vou, que o santo me leva
Medo não me alcança.
No deserto me acho, faço cobra morder o rabo, escorpião vira pirilampo.
Meus pés recebem bálsamos,
unguentos suaves das mãos de Maria Irmã de Marta e Lázaro, no Oásis de Bethânia.
Pensou que eu ando só, atente ao tempo.
Não começa, nem termina, é nunca é sempre.
É tempo de reparar na balança de nobre cobre que o rei equilibra,
fulmina o injusto, deixa nua a Justiça.
Eu não provo do teu fel, eu não piso no teu chão,
E pra onde você for, não leva o meu nome não
Onde vai valente? Você secou, seus olhos insones secaram,
não veem brotar a relva que cresce livre e verde longe da tua cegueira.
Seus ouvidos se fecharam à qualquer música, qualquer som,
nem o bem, nem o mal, pensam em ti, ninguém te escolhe.
Você pisa na terra mas não sente, apenas pisa.
Apenas vaga sobre o planeta, e já nem ouve as teclas do teu piano.
Você está tão mirrado que nem o diabo te ambiciona, não tem alma.
Você é o oco, do oco, do oco, do sem fim do mundo.
O que é teu já tá guardado.
Não sou eu quem vou lhe dar,
Eu posso engolir você, só pra cuspir depois.
Minha fome é matéria que você não alcança.
Desde o leite do peito de minha mãe, até o sem fim dos versos, versos, versos,
que brotam do poeta em toda poesia sob a luz da lua
que deita na palma da inspiração de Caymmi.
Se choro, quando choro, e minha lágrima cai,
é pra regar o capim que alimenta a vida,
chorando eu refaço as nascentes que você secou.
Se desejo, o meu desejo faz subir marés de sal e sortilégio.
Vivo de cara pra o vento na chuva, e quero me molhar.
O terço de Fátima e o cordão de Gandhi, cruzam o meu peito.
Sou como a haste fina, que qualquer brisa verga, mas nenhuma espada corta. "

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Enfrentando a zica

Sabe aquele dia em que você acorda e sente que vai acontecer a maior merda do mundo? Pois é, esse dia existe e a merda sempre é real. A nossa curta existência é cheia de aprendizados, coisas boas, interessantes, mas também repleta de fases turbulentas, esquisitas, ruins, onde você meu amigo se sente o cocô do cavalo do bandido vesgo, fedido e manco. 

Quando uma coisa começa a dar muito errado você tenha a certeza de que está cercado pela zica. Não a Dona Zica, mulher do incrível Cartola o sambista do milênio, mas a zica pura, a má sorte, a urucubaca do mundo todo. Como dizia minha avó Cida: "Quando a merda começa a vir pode sentar e esperar que a avalanche tá só começando." 

Parece um pouco pessimista demais esse texto? Impressão superficial... o que eu quero dizer é que já que está tudo um Deus me livre o importante é manter a calma e tentar controlar a situação, tentar ficar bem e superar com glamour essa fase zicada, sim... porque se a zica começa ela também há de acabar. Acredita e vai. 



Existem coisas que não se deve fazer numa maré ruim, afinal é preciso manter a serenidade. Se você está na merda não vá ao banco pedir o extrato bancário, para que você vai fazer isso? Para ter certeza de que além de estar numa pior você também está chafurdado na pobreza? Não faça isso, esqueça essa bobagem e vá comprar as coisas no crédito, sem pedir a segunda via que é para não lembrar das loucuras consumistas cometidas, e se não tiver certeza se o cartão vai passar faça figas que costuma funcionar. 

Invista em comidas legais, gordinhas e açúcaradas... Eu sei, de repente a fase tá tão brava que nem para o chocolatinho da salvação você tem dinheiro... acontece, mas tudo tem saída e esse e o momento em que você utiliza a criatividade e o dom culinário apostando em versões baratas e ricas em alegria como pipoca com caramelo, pão com ovo e um todynho quentinho. Dor de barriga? Deixa rolar, afinal você já está na merda mesmo...

Evite contato com ex-qualquer coisa ou futuro-qualquer coisa, são motivos de sobra para culpas e aflições de toda espécie. O primeiro costuma esfregar na sua cara suas falhas ou então insistir que ainda é a salvação da sua vida, maior mentira não existe, se fosse estaria vivo até agora no seu coração. O segundo caso gera angústias e culpas, não crie expectativas de que será seu ombro nesse momento difícil, não se apoie nisso, afinal de contas tem que esperar passar a fase para poder tentar um romance com um pouco mais de dignidade na cara. 

Dignidade? Sim, porque se você está na pior deve estar com uma cara horrível, com aquela olheira que dá pra ver na nuca e um semblante pavoroso de autopiedade. Se você é mulher invista num bom corretivo, um bom blush, um rímel e use tudo sem dó, afinal de contas a humanidade não merece ver você arrasada pela vida e nem com cara de cocker chorão. Se você é homem, arrume a barba, um bom perfume e postura ereta, você pode estar na merda mas nunca, nunca perca o glamour de vista.



Para além de tudo isso mantenha a fé em si e tente perceber o lado bom das coisas, no começo é difícil... mas depois cria-se uma certa habilidade de rir de si mesmo e da merda toda. Quando chegar nesse ponto tenha a certeza de que tudo irá melhorar aos poucos, afinal de contas como dizia ainda minha avó Cida: "... mas depois que passa a avalanche toda filha, ah a vida fica uma belezinha viu, fica tudo adubado e tudo cresce mais verde.". Tá vendo? É só acreditar...

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Pé na estrada baby...

"Viajo para conhecer minha própria geografia" - Mário Quintana

Desde tempos remotos a humanidade procura um elixir para suas frustrações, tristezas e corações partidos. Ou você acha que o chocolate surgiu por acidente? Foi uma receita calculada para acalentar os machucados emocionais dos homens bunda mole, tenho certeza disso. Acredito que uma das grandes coisas que um ser humano pode fazer por ele mesmo em qualquer momento da vida é viajar, principalmente se esse momento for tenso, confuso ou te deixar com o saco na lua.

Meter o pé na estrada é essencial, é mágico, é bom. Primeiro porque se tem a doce e necessária ilusão de que saindo de onde você está no momento se acaba deixando para trás o problema que te atormenta, mentira... o problema vai com você, esse lazarento perseguidor, mas pelo menos ele vai de férias, vai de bom humor e parece até menor do que é realmente. 



Segundo porque você sai de circulação, some do mapa, e tem finalmente a possibilidade de ficar sozinho ou extravasar as emoções em território desconhecido, ou melhor, em um território onde ninguém te conhece e nem vai lembrar das asneiras que você, após beber duas garrafas de vinho, pode fazer. E terceiro porque é muito legal conhecer um lugar novo, sentir novos cheiros, novos sabores, novas emoções, ver a estrada passar pelos seus olhos lhe mostra o quanto o mundo é grande e que muitas vezes apequenamos nossas vidas por uma limitação de estrada. 


 E aí meu amigo vale tudo, vale ir sozinho, com o amor, com amigos do peito e amigos sem peito, escondido como a fuga das galinhas ou como prefere meu pai em excursões muito animadas organizadas pela tia mais doida do bairro, para lugares muito família como São Tomé das Letras, a Parada Gay ou colônias naturistas.  

O importante é sair do lugar, respirar um ar fresco que vai trazer idéias frescas a sua mente cansada pela vida real do dia-a-dia. E viagens costumam render boas estórias para uma mesa de bar no fim de tarde, seja pela zica encontrada no caminho ou pelo beijo que você nunca vai esquecer, e francamente não importa a distância percorrida, pode ser 850 kilometros, pode ser 20, mas quantos a sua alma vai percorrer? No fim é isso que importa.

E não se iluda, a adversidade faz parte de qualquer boa viagem. Trilhas perigosas, chuva na hora errada, combustível que acaba, aquele chalézinho que você alugou pela internet e parecia tão lindo e que na hora do cara a cara se demonstra menor que a área do tanque da sua casa...enfim... tudo motivo de superação, risada e de criação. Sim, porque você que sempre vai acampar sem grana sabe que cozinhar com pouco é uma arte, sem fogo então é para poucos...bem poucos.

Quer curar o coração? Viaja meu bem, faça como o Rei Roberto: "Eu prefiro as curvas da estrada de Santos onde eu posso esquecer um amor que eu tive e vi pelo espelho, na distância se perder...", ou então como Cazuza: "Viver é bom nas curvas da estrada, solidão que nada...". Pra quem ainda não tem o desprendimento necessário para viajar vale a pena ler um livro muito legal chamado On the road, ou Pé na estrada na tradução, do escritor norte americano Jack Kerouac, e se a preguiça de ler for gigante veja o filme, uma viagem de caronas, jazz e poesia, amores e todas as intempéries que só a estrada pode te proporcionar. 

Inspirações a parte o importante é não perder de vista a idéia de se jogar nesse mundão de meu Deus, sem pensar muito, sem frescuras e nem cocotices, as melhores viagens não são as muito pensadas mas as muito sentidas. Afinal como disse Marcel Proust: "A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em procurar somente novas paisagens, mas em ter novos olhos".

terça-feira, 9 de julho de 2013

Quem conta um conto...

Sempre ouvi que era uma pessoa exagerada, sempre, desde pequena quando a professora de português pediu para a turma escrever um texto com uma estória e eu fiz praticamente um roteiro de novela mexicana com cerca de vinte páginas de pura emoção, segundo a professora eu havia exagerado um pouco embora ela tenha se emocionado com a estória de Diva Aparecida, a mulher sem o dedo mindinho e que tinha o dom de parar o tempo.

No entanto a minha característica levemente exagerada não chega a aumentar um fato ocorrido a ponto dele ficar distorcido da realidade, talvez um cadinho só, mas não chega no ditado "quem conta um conto, aumenta um ponto".

Sim querido leitor, porque é isso que ocorre com a maior parte de nós, brasileiros de sangue latino, nós temos a habilidade de transformar o mais tedioso dos fatos em uma cena digna de constar nos momentos mais inquietantes da Odisséia de Homero.



Você já presenciou uma cena dessas, eu também, como no outro dia que uma senhora chegou desesperada no trabalho dizendo que havia ocorrido um acidente horrível na rua, minutos depois vem a Dona Rosa e diz que houve um acidente tenebroso na rua, um carro havia batido na ponte, minutos depois o faxineiro disse que não só era horrível o acidente como havia acidentado um menino que passava e que o carro estava destruído, saí na rua pra ver e encontrei a dona do carro, pois é... havia um arranhão no mesmo, a ponte continuava inteira e o tal do menino tinha estourado a havaiana, e ria...

E quando aquela sua tia vem contar a estória que ouviu do fulano que é amigo da sicrana que é prima da mulher que foi pega com dois anões dentro de um fusca? Fofoca aumentada certeza... Sem falar no seu próprio exagero, sim leitor porque eu sei que você também exagera... Como uma amiga minha que diante de uma freada brusca do carro do namorado disse que viu a morte de perto...olha o drama...

Mas a verdade é que sem aumentar um pouco parece que as coisas retornam a banalidade do dia a dia, então porque não por um pouco mais de emoção na coisa? Mas as vezes se carrega tanto na tinta que o efeito é o contrário: alívio.



Certa feita minha irmã fez uma tatuagem escondida, com medo da reação de meu pai minha mãe foi preparando o coitado, disse que tinha acontecido algo terrível com a minha irmã, mas que ela não tinha muita culpa, que era mal da idade e por aí vai, cozinhou o cérebro do coitado até ele pensar em coisas das mais terríveis possíveis. Chegando em casa pediu pra ver minha irmã, quando ela mostrou a tatuagem ele caiu confortado de alívio no sofá, achava que ela tinha ficado grávida, prostituída, afundada no crack.... No fim achou até bonitinha a tal da tatuagem, dos males o menor dizia ele...

Pois é exageros a parte, eu também devo ter exagerado nos relatos, mas é isso que dá o tom... dá emoção, afinal como diz uma amiga minha quando vai contar algo: quer com emoção ou sem?



domingo, 24 de março de 2013

Tatuagem

Marcar a pele requer cuidado, zelo e um certo bom senso... só se marca aquilo que importa, e ás vezes somos marcados sem querer, sem que se importem, cicatrizes da vida, da queda de bicicleta, do tombo de criança... a pele guarda a memória de outrora, algumas marcas vistas a olhos nus, outras mais escondidas: ou no fundo da alma ou no meio da cabeça, como a marca que tenho no alto deste belo cocoruto bem escondidinha, um afundamento superficial de crânio.

Quando era pequena gostava de acordar bem cedo e ler gibi embaixo da mesa de costura da minha mãe, um dia ao ser chamada as pressas levantei embaixo da mesa e bati a cabeça num parafuso enorme que estava lá, doeu horrores e me deixou uma marquinha que só o mais experiente dos mestres do cafuné poderia encontrar...

As marcas que levamos ou deixamos algumas vezes são opcionais, as tatuagens são assim...existentes desde tempos remotos como no antigo Egito, símbolos de poder e maturidade em Bali, são acima de tudo desenhos que fazemos em uma tentativa de celebrar ou enterrar um momento, uma dor, um amor, um valor...



Proibido por diversos cultos religiosos e celebrados em tantos outros, o rito de marcar a pele ora é visto como profanação do corpo sagrado que nos foi dado, ora como proteção e autonomia espiritual e moral. 
Marinheiros e navegantes se encarregaram de transmitir o costume aprendido, nas terras orientais da Polinésia, aos ocidentais mais atrevidos, bruxas na idade média eram marcadas para serem queimadas na fogueira da inquisição.

Mafiosos e bandidos usaram a tatuagem para criar um código rígido de posição e identificação, os modernos marcam palhaços, pinups, tribais e ideogramas japoneses... esses muitas vezes equivocadamente, tenho um conhecido que jurava estar tatuando a palavra amor e a realidade descoberta na feira da liberdade em São Paulo anos depois era a de que o ideograma significava "tenho fome", o que não era de todo mentira, afinal ele era um desses obesos de mente.



Eu gosto de tatuagens, o Chico também... é dele uma das músicas que eu mais gosto e que traduz bem a intenção da coisa, marcar, eternizar um momento, numa urgência de desejo e afeto, nostalgia e autoconhecimento. Mas no caso do sempre incrível e muso mor Chico Buarque, a tatuagem é um desejo de viver eternamente colado ao ser amado, lindo, lindo:

Quero ficar no teu corpo 
Feito tatuagem 
Que é pra te dar coragem 
Prá seguir viagem 
Quando a noite vem... 
E também pra me perpetuar 
Em tua escrava 
Que você pega, esfrega 
Nega, mas não lava... 
Quero brincar no teu corpo 
Feito bailarina 
Que logo se alucina 
Salta e te ilumina 
Quando a noite vem... 
 E nos músculos exaustos 
Do teu braço 
Repousar frouxa, murcha 
Farta, morta de cansaço... 
Quero pesar feito cruz 
Nas tuas costas 
Que te retalha em postas 
Mas no fundo gostas 
Quando a noite vem... 
Quero ser a cicatriz 
Risonha e corrosiva 
Marcada a frio Ferro e fogo 
Em carne viva... 
Corações de mãe, arpões 
Sereias e serpentes 
Que te rabiscam 
O corpo todo 
Mas não sentes...

quinta-feira, 14 de março de 2013

...

E para quê dormir?
Repousar o corpo, inerte, quente, frente a janela, ao mundo e às estrelas.
O corpo não importa, a alma quer a porta, o portão, a saída do coração, quer fugir e seguir o caminho adocicado e perfumado, sem vigias e nem cadeado.
Quer ir longe, ir além de qualquer desdém, de qualquer injúria, sem penalidades a não ser a enormidade das saudades, tem uma coleção delas, umas mais douradas outras mais cheirosas, algumas sem cabelo e outras toda prosa, guardá-as com respeito, um dia elas partirão e deixarão o carinho na palma da mão, assim o amor nunca é em vão, ele fica quietinho na fresta da eternidade, debaixo do colchão, escondido, miudinho como um menino a espiar pela fechadura da porta, espia meu sono que a alma já volta.

sexta-feira, 1 de março de 2013

O telefone tocou novamente...

- Alô?
- Oi filha, tudo bem querida?
- Oi mãe, tudo bem e a senhora?
- Tudo bem, estou morrendo de saudades de você, queria muito que você estivesse aqui em casa, ontem quase chorei de saudades, quando você vem pra cá?
- Então mãe, é que eu to meio sem grana para viajar agora, também tenho umas coisas para fazer, uns trabalhos para agilizar, mas de repente se você desse uma ajuda, um auxílio transporte quem sabe...
- Ah não, quero dizer, fica aí ajeitando suas coisinhas né, senão você fica mais desorganizada ainda, falando nisso você tem arrumado seu armário? Sim, porque eu me lembro a zona que você fazia e...
- Mãe... fica tranquila que o armário tá bom...
- Filha..
- É sério mãe, mas e aí tá tudo bem?
- Tá sim, tirando que seu pai não pára de me encher, minha chefe tá com a macaca, o encanador deu um cano em mim, a vizinha de baixo não pára de ouvir lek, lek, lek, o seu irmão tá com uma pereba na bunda, a Belinha vomitou no tapete, o meu cliente é um fdp, e a sua tia tá meio doida tá tudo bem sim, tá tudo ótimo, mas eu ando preocupada com você meu anjo...
- Ah que bom que tá tudo uma maravilha, comigo?
- É, com a senhorita...
- Mas porque?
- Ai filha, você tá comendo direito? Tá comendo manga?
- Manga?
- É, eu vi na tv que manga é bom para pessoas desorganizadas e..
- Mãe!
- Ai filha, seu irmão casou, sua irmã tá namorando...
- Mãe nem começa....
- Filha você tem que arrumar alguém né, acho que isso ia dar um realce na sua vida...
- Mãe...
- É verdade, e chega desses homens pé rapado que você gosta... você tem que arrumar um cara que te dê uma certa segurança, mesmo porque você vive dura, um cara bonito, bacana, limpinho, com todos os dentes e que tenha um respaldo financeiro né...
- Mãe, achar um cara já tá complicado imagina com grana...
- E de preferência moreno né, que é mais bonito, porque os loiros não dão certo com você...
- Mãe, não dá pra achar alguém que preencha todos os seus requisitos.
- Ah mas pelo menos uns três dá né filha, você é tão bonita, tão inteligente...
- Tá bom mãe, já deu esse assunto.
- Ai verdade filha, eu esqueço que você anda recuperando o seu coração, mas não esqueça que você tem um corpo heim..
- Mãe!
- Tá bom, tá bom, mas porque você tá nervosa? Tá comendo manga?
- O que tem a porra da manga mãe?
- Ah é que vi também que ela melhora estados nervosos, eu comi três ontem. E já colocou cortina no quarto?
- Não mãe, to sem furadeira.
- Ah mas quando eu quis te dar uma você me falou que não era presente de natal, que você era uma menina e queria coisas de menina, justo você que consertava telhados e os disjuntores da casa, tá vendo como você anda estranha, eu to preocupada mesmo...
- Mãe, eu só falei que queria ganhar uns creminhos junto com a furadeira... e não e´você que vive falando para eu ser menos grossa e mais feminina?
- Ah filha, tá vendo, você sempre confusa... anda escrevendo?
- De vez em quando...
- E lendo? Já leu cinquenta tons de cinza?
- Mãe eu não vou ler essa sacanagem para mulheres maduras.
- Tá me chamando de madura?
- Mas isso não é bom, madura é bom...
- Tá me chamando de manga?
- Bom, é uma das pautas da conversa pelo visto.
- Olha realmente não dá pra conversar com você, você é muito grossa, falando em grossa você tá lixando o pé?
- Mãe....
- Ah é né, você com essa mania de andar descalça daqui a pouco tá com o pé que nem o do seu pai... aí vai ficar mais difícil né...
- Difícil o que? deixa meu pé ele tá bom...
- Eu sei que você tem vergonha do seu pé por conta daquele dedo, mas tem que superar viu filha, tem que superar....
- Mãe você tá usando drogas?
- Filha! 
- Tá bom, brincadeira...
- Bom, eu tenho que desligar, mas to morrendo de saudades, mamãe te ama viu, mas faz o seguinte vai no cabeleireiro se arrumar isso melhora o humor.
- Tá bom mãe, vou ver...
- Ah e quando você vier tem umas prateleiras que caíram eu quero que você arrume, e também tem o ferro de passar para você consertar o fio e....
- Tá bom mãe, deixa aí que eu arrumo quando der pra ir...mas se você quiser me mandar a passagem e..
- Um bom dia pra vc meu anjo, bjo!
- Beijo mãe.